terça-feira, 17 de março de 2009

Na fala

texto de Izabel Xarru


Nem que fosse a fórceps. Dali, do labirinto externo que sugava para o ouvido a mais nociva doçura ou estilhaço de vidro no esôfago, teria saído meu primeiro filho. Foi dali. E vingou. Seja lá o verbo como seu destino. Filho que rompeu o ocre do afeto e corrompeu artérias, recaptações, alcances, atuações, cismas e otras cositas más.

Ah, sim. Vinha com força de pedra formada no fogo. Naquela antiguidade estúpida como um monitor de mortes sem mensura, aquele retorno que reproduz e não interpreta. Ali estão as bradicardias com queda de saturação, o rosto-hematoma, e vão apitando, a cada impulso milimétrico do Corpo, os seus sensores. Reunidos em gangs, entre iguais, os iguais, entre os rostos em deformação, os piores sons, as imagens que atravessam as cartilagens e incrustam nos Ossos, a perda irreparável de sangue e oxigênio no cérebro.

O Corpo: este que nos une e separa, como uma vírgula, ou uma caverna sigilosa, ou uma vigília que esmaga.

Agora vou dormir. Sabe o que é isso?

Ele será Seu.
O nome dele é Música.
Ele tem diásporas nas extremidades e ouro laminado em cada senha.
Átrios: entre e venha, no mínimo, Pérola.
Venha de joelhos, caso se sinta mais confortável.
O melhor, eu sei:
O mundo não produz duas anêmonas de mesma cor
e as hóstias, fulano, as hóstias...
nunca valeram a dor da Confissão.

5 comentários:

Samantha Abreu disse...

que belo, Bel.
me rompe, parece, os sons e os sonos deliciosos de sonhos.
Confessar, de fato, é para os fortes ou para o que moram em cubículos, solitários, com qquer entidade na qual acreditem.
Eu me confesso com a minha: a chaga.
Lindona!

ps:eu nasci de fórceps.
por isso digo que me botaram aqui à força, e agora eu vou ficar, só de pirraça.

Unknown disse...

Caraio, Iza, preciso voltar a ler seus escritos. Valeu pela lembrança!!!

já tenho lesadosemgeral disse...

Prá doer e prá pensar.
Melhor sentir.
Porém, incapaz, eu.
Prefiro apenas declarar a "forteza" que esse texto tem prá invadir.

Paulo Castro disse...

Na verdade, tudo se trata da inscrição da linguagem sobre o corpo, ou a linguagem recebendo o corpo, essa ida e volta volta e ida que deixa o texto magnífico, em uma possibilidade quase de história infantil: conheço uma em que um macaco entra dentro de uma velha e resolve sair pelo nariz ou pela orelha dela...
O infantil é total possibilidade do corpo, "in potentia".
O teu texto é total possibilidade do corpo ( mesmo morto) e da linguagem nele e por ele...
Te beijo !!!
º

Anônimo disse...

Trocar a interpretação pela experimentação mas colocando a dose de esquecimento adquirida por prudência e não há hóstia, nem dor, nem confissão que sobreviva.
Só vida!

Grazzi