domingo, 30 de agosto de 2009

Grazzi Yatña

Tenho um tremendo sono ontológico hoje.
Conhaque.
Cairia bem.
Sim, pelo avançar onírico, um conhaque definitivamente cairia bem.
Onde paro ?
Onde parar ?
O solo faz a caixa de som tremer.
Paro no tremer. Suspirosa. Lua agora vermelha. ( Peito ).

Amanhã dizem que é domingo aqui. De modo que há aquele típico deslocamento de tempo, que leva consigo palavras. Coisa boba, como "domingo com cara de sábado". Convenção burguesa, que lucra com o tempo da ilusória infinitude. Da conversa infinita, ou da vitória de ouvir a mesma música por horas a fio, afinal, o utilitarismo nesse tempo deslocado está vencido, mesmo que não mais, não mais, a guerra possa ser ganha. A arte da Conversa, em que a conversa é vista como a arte suprema, que não deve ser pesada, que deve antes de trazer razão ( utilidade ), trazer prazer, as palavras que juntas não fiquem justas: palavras em prol apenas do prazer, em que mesmo o silêncio seja som, o da espera que sabe-se promulgada
em tempo finito. Eu, sujeito em predicado: idílio do que dizem apenas como dias, requinte com desiderato, anuência do sentido unívoco.
Bom mesmo é se adorar com exceção à regra.
Na verdade, se é que a verdade me interessa, o melhor presente é o não recebido.

E onde estou com essa conversa ?
Não sei.
Sei sim.
Ao lado da minha adolescência confessa e gozada (!!), também gosto de estar
na exatidão das palavras gratuitas.
Que bom.
Relaxo como se fosse agora, ombros e tal: a minha hora é linguagem que veio do depois.
..

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Grazzi Yatña

Nada ficaria por fazer.
Dissemos algo bem distante da preguiça, a vida toda, não lembro bem o quê pois o ninho era silêncio agitado, desembalando mundo e chacoalhando do acaso.
A intensidade da clausura mais linda nos trouxe o entendimento da fome sem conclusão de dor.
Ainda vejo as ruas como enquartelamentos dos vestiários, salvo alguns ataques de terrorismo poético mas pobremente sem encaixe de significado amarrados fatidicamente pela esperança. Ainda bem que tem você nu, desafiando todos os discursos e bem inserido nos gols.
Sempre gostei da nossa cidade, cidade que é zona de apaixonamento.Cogita-se liberdade só quem não a suporta em si.
As crônicas mais aceleradas, debochando do tempo-espaço entre um gole e outro, nos cabe perfeitamente: passado, presente e futuro é só um pouco de ridículo na fumacinha do meu cigarro nos sacando.
Existe o Sublime, após e mesmo antes da beleza. Belo é balbuciar. Sublime é o trovão
com relâmpago. Ainda mais se cai perto, ou se cai longe, iluminando montanha como se fosse fantasma enorme e visionário.
São três os estados da matéria: a ironia, a indiferença, a amorosidade. Com você, sempre tive isso de baixar a guarda e permitir o amor.
Quando a guarda está levantada,cansa mesmo, é a ironia, mas ela defende da indiferença, que dá um enorme sono de viver.
Claro que não é tão simples. Mas pra te dizer do amor, pai.
O que resta da experiência do sublime é uma espécie de categoria da memória, que podemos chamar de "O retorno".

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Bourbon Está Ok.

Por Paulo Castro.





-ei cara você precisa pensar em subir na vida.

disse isso dando a cotovelada de sempre, antes de dizer a mesma coisa de sempre,

que consistia em propor algum negócio "inédito nas paradas" que já eram garganta de museu.

- tudo bem, um dia eu subo. o que você quer beber ?

- não quer nem ouvir ?

- bourbon ?

- pode ser.

pagou a conta, a do outro e colocou uma nota de cinco entre a coxa dançarina e o cano de metal reluzente e perfumado. uma piscadinha e quem sabe mais a tarde.

mais a tarde logo estará em silêncio, ele sabia, um silêncio na cama de molas, no chão, fumando na janela. bem de lá era possível ver a igreja e suas gentes que entravam, saiam, sem carregar nada de novo fora uns dez passos mais altivos que logo cediam à corcundez, mesmo nas crianças e nos flocos de neve. como sempre. era engraçado. era triste. engraçado de verdade sempre é um bom tanto triste, pensou e disse monocórdio para a foto de uma desconhecida que habitava única a parede.

aquela foto já estava lá quando alugou o apartamento e nunca vira motivos para retirar de seu pouso, a moça sorria em branco e preto e de onde quer que você ou eu ou ela a olhasse, sempre estaria olhando para nós. brincava que era sua namorada. fumavam juntos, ele assoprando a fumaça em sua cara sorridente, receptiva.

das vezes em que trazia mulheres para o local, não pensava na jovem mulher emparedada. mas raramente pensava em alguma coisa quando trazia alguém para o, seja dito, local. as mulheres falam automaticamente e se sentem muito bem, apenas você dando espaço para que elas assim o façam. sorria vez em quando, concordava entre tantos, sem nem ao menos saber, e isso bastava para que o sexo a seguir fosse mais eficaz que a igreja. dava a cada mulher, via pela janela, fumando pela janela ( antes de terminar o cigarro na foto de sua namorada ), que lá iam altivas, donas de si, cheias de certezas, oferecia uns trinta, trinta e cinco passos. engraçado, triste e relativamente inútil, na neve torta.

bem diferente de ficar na cama brincando com a mola solta que rasgara o estofado. desce, segura, pula ! no mais absoluto silêncio. até que ele e a mola adormecessem, de bem.

então tinha ou não tinha algum trabalho pra fazer. pedreiro, bibliotecário, observador de flores e pássaros. disso ele gostava. um velho que o contratava todo verão e pagava pouco, mas as recompensas valiam: via pássaros ( feios ou bonitos, alguns deformados, anormais, pela fumaça e o azeite citadino) que não constavam no manual, sempre ampliado, que o velho anualmente lhe armava as mãos para olhos. fotografava. fumava um cigarro e só então, antes de se levantar, sorria. pensava em como poderia ter sido a vida exclusiva de sua namorada, provavelmente já morta, diz ditado, pouco importa.

ou não tinha mesmo um trabalho para fazer, restando pular essa parte e voltar ao bar, ao cara do cotovelo e às dançarinas, já de noite e com alguma algazarra dos turistas, que não incomodavam por não irem fundo, sendo apenas turistas de superfície que eram. dos frequentadores, incluindo a sua, as banquetas eram cativas e os melhores ângulos para aquelas moças verdadeiramente belas e sem grandes falas, fora as músicas de Serge Gainsbourg.

- Bourbon ?

- Não quer mesmo ouvir uma parada que pode mudar sua vida ?

- Não.

- Bourbon está ok.

º

domingo, 2 de agosto de 2009

Ela

texto de Izabel Xarru



Guardo um porquinho, duas hienas, uma pata, três carneiros, uma sombra, um vagão, algumas árvores. Encosto a cabeça na cadeira. Guardo os ovos dentro de trompas de falópio, movimento os cílios, enxugo dois desterros e um vagão. Soa o tiro: sou amada e é verdade. Coloco dois terços num quarto, apago a luz, respiro (isso dói), trago o caminhão.
Entre seus ombros está um mundo de rococós. Ela confeita o bolo com tudo que não existe e cresce em mim como uma ave. Ela me leva, eu peso, ela me leva, eu afundo, ela corre, admiro, ela voa, eu caio no vagão.
Apesar disso que não armo, agradeço.
Não sei a quem. A algum circo. Tabuleiro.
Não, porque ternura.
A ela, talvez, meu único abraço marinho.
E a despedida dos afogados.